Por Rafael Barbosa e Rodrigo Ferraz
Atualizado em 27/12/2013.
Nos últimos dias, a não renovação do contrato de Lauro César Muniz com a Record após oito anos de serviços prestados a emissora, ganhou espaço em vários blogs e sites sobre televisão. A notícia é vista com pesar por grande parte de noveleiros, admiradores do autor e por aqueles que acreditam na teledramaturgia da emissora. Lauro escreveu duas das melhores novelas da Record na última década, Cidadão Brasileiro (2006) e Poder Paralelo (2009), que obtiveram bons números de audiência e que agradou a crítica. Por outro lado, escreveu o retumbante fracasso Máscaras (2012)que derrubou os números e conseqüentemente acabou gerando a crise que se abateu sobre a teledramaturgia da Record, que não conseguiu emplacar mais nenhuma outra novela depois. Diante disso, fica aquela sensação de que um grande autor está sendo descartado e desacreditado devido a um fracasso, como se tudo aquilo de positivo que fez perdesse seu valor.
Paulo Gracindo e Yara Cortez em O casarão |
Lauro é das antigas, um dramaturgo e novelista dos mais renomados, com várias peças de teatro de sucesso em seu currículo, assim como algumas das melhores novelas já produzidas no Brasil. Lauro pode não ser dos autores mais populares, mas sua obra é de suma importância para história da teledramaturgia nacional. Nos anos 70 quando a telenovela explodiu, ele estava lá ao lado de grandes nomes como Janete Clair, Dias Gomes, Bráulio Pedroso e Cassiano Gabus Mendes que impulsionaram o gênero. Lauro é um autor inteligente, sofisticado e transgressor, que sempre buscou oferecer histórias ricas, densas e contundentes, ao mesmo tempo em que tentou por diversas vezes fugir dos lugares comuns e apresentar projetos não muito convencionais, com novas possibilidades de estrutura narrativa e de linguagem, trazendo assim algum sopro de originalidade para o gênero. Foi assim com O Casarão (1976), obra icônica em que inovou ao apresentar simultaneamente as épocas diferentes em que a historia se passava, abrindo mão de uma seqüência linear dos fatos, e também com Espelho Mágico (1977), em que o autor ousou ao apresentar uma novela dentro da novela, retratando os bastidores da teledramaturgia, entre outras ousadias. Essa preocupação do autor em inovar vem desde muito tempo, sua primeira telenovela, Ninguém crê em mim, exibida na TV Excelsior em 1966, foi o que se pode chamar de percussora das grandes mudanças trazidas por Beto Rockfeller de Bráulio Pedroso exibida mais tarde na Tupi, que revolucionou a telenovela no país.
Susana Vieira e Tarcísio Meira em Escalada |
Escalada (1975), O Casarão, Roda de Fogo (1986) e O Salvador da pátria (1989) são novelas clássicas e marcantes de Lauro, seus maiores sucessos, com tramas fortes, de enorme teor político e social e com várias intercessões históricas, características que ele levou para Cidadão Brasileiro, que se tornou uma das obras mais marcantes da Record. A minissérie inspirada na vida e obra da compositora e maestrina Chiquinha Gonzaga (1999) também é considerada uma das produções mais primorosas da Globo neste formato. No teatro, escreveu peças de muito sucesso como: O Santo Milagroso (adaptada para o cinema e TV), A morte do Imortal, O líder, Sinal de vida e Direita, volver. Como todo autor, Lauro teve seus fracassos, Máscaras e Os Gigantes (1979) são os maiores deles, mas uma coisa que também vale destacar no autor é a maturidade e humildade com que se posiciona frente a esses equívocos, reconhecendo o erro e refletindo sobre ele.
Até hoje Lauro apresenta uma enorme preocupação com os rumos que a teledramaturgia vem tomando e com o seu futuro. É um dos maiores defensores de um novo formato para as novelas, e que enxerga a urgência de reinventar o gênero. Para ele essas mudanças consistem principalmente na redução de capítulos, o que possibilitaria a seus autores uma maior individualidade com sua obra, preservando assim o trabalho autoral, o que também significaria maiores possibilidades de criatividade, a redução de custos de produção, diminuição de colaboradores e auxiliares de direção e a ampliação do mercado para novos nomes. Lauro mostra com tais idéias, que ainda tem muito a contribuir para nossa teledramaturgia, é um autor que precisa ser ouvido e valorizado como se deve, não só pelo que já fez, mas pelo que ainda pode fazer. É de se lamentar a má vontade da Rede Record com o autor, que chegou a apresentar um novo projeto para emissora, uma minissérie sobre o maestro Carlos Gomes. Abrir mão de um dos maiores autores do país, com tantos feitos bacanas, baseados em um fracasso cuja responsabilidade vai além do trabalho dele a frente da escrita de capítulos, é sem dúvida mais um dos equívocos da emissora.
Para 2014, Lauro tem um super projeto para o cinema em parceria com os Estados Unidos, possivelmente uma participação mais ativa no teatro, mas e quanto ao seu futuro na televisão? Uma volta para Globo seria algo muito interessante, mas as relações do autor com a emissora parecem não ter ficado das melhores após sua saída de lá. E uma das coisas que incomodam Lauro é a maneira com que a Globo minimiza seu papel e importância na historia da teledramaturgia da emissora, por ele ter feito parte da concorrência. A ida para TV á cabo também seria uma possibilidade, já que esta vive em um bom momento. Mas e então, como fica Lauro agora, sem nenhum contrato? Será que ainda poderemos vê-lo em pleno exercício de seu oficio em um novo espaço? Fico na torcida para que Lauro volte um dia a nos apresentar suas idéias e novos projetos, e que as emissoras do país voltem a reconhecer seu trabalho como se deve, afinal Lauro Cesar Muniz não é qualquer um, é um autor que no mínimo merece maiores créditos que lhe dão neste momento.
Observação importante: No primeiro parágrafo, quando este post diz " Por outro lado, escreveu o retumbante fracasso Máscaras (2012) que derrubou os números e conseqüentemente acabou gerando a crise que se abateu sobre a teledramaturgia da Record, que não conseguiu emplacar mais nenhuma outra novela depois", está apresentando uma visão que muitos tem sobre a atual situação da teledramaturgia da Record, uma visão simplista demais até. Pecamos talvez por apresentar essa visão simplista e em não se aprofundar sobre os diversos fatores que desencadearam essa crise, que como dissemos em um trecho do penúltimo parágrafo, vai além do trabalho de Lauro a frente da escrita dos capítulos de Máscaras, e por isso esperamos que Lauro nos perdoe. Máscaras fracassou não só pelos equívocos de seu autor, mas também e principalmente por equívocos da emissora no que diz respeito a falhas graves de produção, a falta de cuidado com a novela que tinham no ar com as constantes mudanças de horário, de direção, os conflitos internos, falta de organização, a ausência de uma diretoria artística competente que entenda e saiba investir em teledramaturgia e por uma série de outros problemas. As novelas seguintes padeceram com o mesmo problema, até mesmo a ótima, Pecado Mortal que enfrenta índices abaixo do esperado. Enfim, a crise da teledramaturgia da emissora que não consegue mais elevar seus números com suas novelas, está longe de ser responsabilidade de Lauro ou da mal fadada Máscaras, se a crise existe a responsabilidade é da emissora que após acertar com a contração de Carlos Lombardi, insiste em voltar a errar em abrir mão de um grande Lauro César Muniz.
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