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POST VIP - Solange Castro Neves relembra Ivani Ribeiro e os bastidores da novela "A Viagem"



Com Solange Castro Neves


Solange Castro Neves é autora e novelista. Além de ter escrito "Marcas da Paixão" e "Roda da Vida" na TV Record, ela foi pesquisadora de inúmeras novelas na Rede Globo e foi a única colaboradora da grande novelista Ivani Ribeiro nas novelas "Mulheres de Areia" e "A Viagem", dois fenômenos de audiência, crítica e repercussão. Em 2011 ela nos brindou com um ótimo texto sobre "Mulheres de Areia" [LINK], agora com a volta da trama "A Viagem" no Canal Viva no próximo dia 14 de julho, a convidamos para relembrar esse trabalho. Confira abaixo mais um brilhante texto.

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Foto inédita da Ivani Ribeiro
Acervo Solange Castro Neves

IVANI RIBEIRO, mestra, amiga e mãe de coração. Saudade desta pessoa maravilhosa que fez parte da minha vida e encantou milhares de telespectadores, com suas tramas envolventes repletas de mistérios, ação, paixões ardentes, com um toque de magia, humor e fantasia, o que acalentava os corações das pessoas, tirando-as, assim, dos problemas do dia a dia.


A VIAGEM foi uma novela baseada no romance “E A VIDA CONTINUA”, escrito por Chico Xavier em 1968. Um caso de amor eterno em uma história muito bonita e esclarecedora; ela mostra que a morte não é o fim. Já dizia Chico Xavier: - Nós morremos, mas nossa missão continua no plano espiritual.

A primeira versão foi em 1975 com Eva Wilma e Altair Lima. Quando Mario Lúcio Vaz quis fazer o remake da A VIAGEM, eu já trabalhava com Ivani há muito tempo. Como ela estava passando por problema de saúde e familiar, deparei-me, de repente, com uma grande responsabilidade nas mãos. Um remake é muito difícil de escrever, mais do que a história original, porque você tem que enfrentar comparações com a anterior; o tempo que passou e de uma forma ou de outra, ainda atrair o público para uma nova ótica.

A Ivani brincava que a Christiane Torloni era a minha Diná porque olhei a personagem sob outro prisma, mas para minha alegria, ela adorou o contexto final.



Para mim, A VIAGEM foi uma experiência única que enriqueceu ainda mais a minha vivência com a Cleyde (Ivani). Um dos exemplos mais fortes, durante toda a novela, foi através do personagem “Mascarado” que tomou uma proporção muito maior do que esperávamos. As crianças e mesmo os jovens e os adultos, se apaixonaram e transformaram o personagem numa mistura de palhaço e super herói, e outros acreditavam que ele era um anjo enviado dos céus, para proteger as pessoas. Não poderia deixar de enaltecer o trabalho excepcional do ator Breno Moroni. O Mascarado, não sei se vocês se lembram, tinha um amor do passado que era a Suzi Rego, que ele reencontra mais tarde. Com a aproximação do casalzinho apaixonado, ele começa a fazer plásticas no rosto para tentar reconquistar a antiga namorada. A Ivani, não dava conselhos, apenas me contava uma história.



Lembro, como se fosse hoje, dela me falando sobre uma vizinha que quando jovem era uma mulher de vida fácil (prostituta) e no seu trabalho veio a conhecer um médico, com quem acabou se casando, tendo filhos, enfim, constituindo um lar. Ivani fez questão de ressaltar que a moça tinha olhos muito tristes, e que não era feliz, pois no fundo não se adaptou à rotina do dia a dia de uma dona de casa, sentindo falta da vida de antes, onde cada noite era diferente uma da outra. Como diz o ditado, para um bom entendedor, meia palavra basta, e eu compreendi, assim, que o Mascarado também não seria feliz tendo uma vida comum, depois de ter vivido tantos anos, multifacetado em vários personagens, rodeado de pessoas inebriadas pela sedução de sua magia. Assim, um belo dia ele acorda, veste uma das fantasias e sai livre, pelo mundo, encantando a todos.


Guilherme Fontes em "A Viagem"
Também devo ressaltar que o sucesso desta novela, se deu ao trabalho em conjunto, da equipe toda: da autora; dos diretores, meu grande amigo Paulo Ubiratan, Wolf Maya; dos atores Christiane Torloni; Antonio Fagundes; Laura Cardoso; Andrea Beltrão; Denise Del Vecchio; Maurício Mattar; Guilherme Fontes, um vilão que surpreendeu a todos; Lucinha Lins; o saudoso Claudio Cavalcanti; Suzy Rego; Thaís de Campos; Ary Fontoura, Nair Bello, John Herbert e Lolita Rodrigues, um quarteto que emocionou a todos. Enfim, de todo elenco: Eduardo Galvão; Chris Pitsch, Claudio Fontana; Fernanda Rodrigues; Irving São Paulo; Jayme Periard. Não poderia deixar de falar de Miguel Falabella, que a maioria das pessoas conhece apenas como ator cômico e que nessa trama, deu um banho de interpretação como Raul, personagem denso, dramático, que enriqueceu muito o seu núcleo.


Maurício Mattar e Miguel Falabella em cena de "A Viagem"
Relembro agora de uma peculiaridade interessante. Aprendi com a minha mestra que devemos um respeito muito grande a todos os atores e que num diálogo, quando eles respondem à altura, a nossa obrigação, como escritora, é devolver a eles na mesma proporção, e assim me deixei levar pelo entusiasmo e fui aumentando o papel do Raul, o que me valeu reprimendas... rsrsrs. Mas não me arrependi, o resultado foi além do esperado: o ator se revelou no papel dramático.

A VIAGEM, apesar de ter, no seu fio condutor, um tom espiritualista, o que poderia causar polêmica, em todo o seu decorrer não desencadeou nenhum problema. Na primeira versão, a Ivani tinha as respostas dadas por Herculano Pires, mas estas se perderam e como ele já havia falecido, então procurei por cautela, cercar-me de profissionais de gabarito que me auxiliaram em todas as áreas distintas como: cardecismo, catolicismo, maçonaria, rosacruz, umbanda e candomblé, de onde tirei a síntese, respeitando assim o ponto de vista de cada uma.


Antônio Fagundes e Christiane Torloni em "A Viagem" (Foto: CEDOC/TV Globo)

Por causa de A VIAGEM, muitas pessoas me rotularam como espírita. Na verdade, eu Solange, acredito que todas as religiões levam a Deus. Gosto de estudar e me aprofundar em cada uma delas e tenho a certeza de que a religião, como o nome mesmo diz, é o re-ligar a Deus e que somos nós, humanos, que falhamos e não as religiões. Como Jesus disse: - A casa de meu Pai tem muitas moradas.

O remake foi um grande sucesso, um dos maiores ibopes da TV Globo. Infelizmente, nesse ínterim, a doença da Ivani se agravou, ela teve de ser hospitalizada e o Mário Lúcio Vaz, meu amigo querido, percebendo meu trabalho enlouquecedor, veio à minha casa com Maria Carmem Barbosa, com o intuito dela me ajudar a escrever, mas apesar de gostar muito do trabalho de Carmem, não pude aceitar, porque a Ivani confiou a sua obra a mim e eu, conhecendo o amor dela pela sua história, não podia trair a sua confiança. Assim, continuei trabalhando sozinha até o fim.



A VIAGEM é uma novela atemporal, pois o amor permeia os corações de todas as pessoas, indiferente ao credo, raça ou religião e ela tem algo de muito especial, o dom de mexer com as emoções imorredouras das pessoas, fazendo com que elas se voltem para o Ser e não para o Ter, e revejam os verdadeiros valores intrínsecos ao ser humano.

Tenho certeza, quantas vezes A VIAGEM for reprisada, vale à pena ver de novo.
Beijos, com carinho,


Solange


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