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Mary Tyler Moore e sua Beth de "Gente como a Gente"

Por Daniel Miyagi


Os portais brasileiros deram pouco destaque à morte da atriz Mary Tyler Moore. Olhei o UOL, iG, G1, nenhum deles noticiava na capa. Já os jornais O Globo, Estadão e Folha, pelo menos nos seus cadernos de cultura deram uma ênfase maior.

Nos Estados Unidos ela foi símbolo do movimento feminista, uma das maiores atrizes dos anos 60 e 70 com os seriados/sitcom "The Dick Van Dyke Show'' e  "The Mary Tyler Moore Show". Este segundo, foi seu maior sucesso de carreira, tanto de critica como de publico que ficou no ar até 1977 nas noites de sábado, tanto que ganhou quatro Emmys pelo seriado. Nessa serie, ela é Mary Richards, mulher de meia-idade e que se muda para trabalhar na redação de um telejornal que enfrenta baixos índices de audiência.

Mesmo ela não querendo, ela se tornou um símbolo feminista pela serie, que abordava entre outros assuntos, igualdade salarial e métodos anticoncepcionais, coisa não muito comum naquela época; mulheres pensarem por conta própria sem a dependência masculina e ser protagonista de um seriado. Desde os 33 anos lutava contra um diabetes e desde então, se dedicava a estimular a educação sobre a doença. Uma atriz inovadora, produtora e defensora apaixonada da Fundação de Pesquisa do Diabetes Juvenil, Mary será lembrada como uma visionária valente que acendia o mundo com seu sorriso", disse em comunicado a agente da atriz, Mara Buxbaum.


Mas eu faço parte do time do resto do mundo, que a conheceu assistindo o filme "Gente como a Gente", primeiro filme de Robert Redford. O filme fala de toda transformação e desestruturação que passa a família Jarret, a partir da morte do filho mais velho. Filho esse que era o preferido de Beth (Mary Tyler Morre), ela nunca fez ou conseguiu esconder a predileção pelo primogênito. Com a morte, Beth se torna seca e amargurada, ao mesmo tempo em que tenta manter as aparências de uma família feliz. Conrad (Timothy Hutton) se sentia culpado pela morte do irmão (já que os dois estavam juntos no acidente e só ele sobreviveu) tentando ate o suicídio, tornando mais distante a relação com a mãe. E Calvin (Donald Sutherland), marido de Beth e pai dos meninos, tentava ser o elo entre eles, mas não conseguia, pois também não sabia lidar com a perda do filho mais velho. 

Eu era adolescente ainda, quando vi o filme na Globo, dublado. Fiquei impactado. A incomunicabilidade permeava quase todo os personagens. Quem tentava ser esse elo de comunicação foi o Dr Tyrone (Judd Hirsch) psiquiatra de Conrad. Eu era o adolescente sem causa na minha família, tinha embates e brigas horríveis com meus pais querendo mostrar minha independência e ao mesmo tempo querendo me mostrar e ser visto por eles. Mas não conseguia. É muito sofrido para uma família quando tem uma distancia enorme entre pais e filhos e isso se agrava quando ocorre uma tragédia avassaladora que nenhum membro sabe como lidar com isso. 

Tymoth Hutton ganhou o Oscar de melhor ator coadjuvante, embora ele tenha sido o protagonista. E Mary Tyler Moore concorreu ao Oscar de melhor atriz, e injustamente não ganhou. Ela estava esplêndida na mãe corroída pela dor da perda do filho querido e preferido ao mesmo tempo em que não sabe como lidar com o outro, que esta vivo. Conhecida pelas series de comedias que ela fez, mostrou toda sua veia dramática, com um personagem pesado, sofrido, doloroso. Até hoje, depois de décadas, ao lembrar do filme e ter visto algumas cenas no Youtube, me emociono com as cenas entre Conrad e Beth, cada um no seu sofrimento interior ao mesmo tempo estão pedindo por socorro, colo, carinho.

As grandes tragédias familiares são as que ficam marcadas nas grandes  historias da vida. Os grandes clássicos gregos são tragédias familiares, Nelson Rodrigues abordou bem a hipocrisia e feridas familiares. Vimos agora com Dois Irmãos, e me lembrei desse filme, Gente Como a Gente. Mary Tyler Moore não teve a vida fácil, além do diabete, foi alcoólatra, e no mesmo ano que Gente Como a Gente ganhou o Oscar de melhor filme, direção, roteiro adaptado (além do ator coadjuvante), a atriz perdeu seu único filho, Richard, de 25 anos, por ter levado um tiro acidental.

Abaixo, peguei do YouTube um compilado das cenas entre Conrad e Beth juntos mostrando toda a complexidade da relação entre eles, até o final com aquele gesto inesperado de Conrad com a mãe.



Fontes : Folha de Sao Paulo, O Globo, Estado de Sao Paulo, Portal Terra e Adoro Cinema


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Sobre o autor

Daniel Miyagi gosta de falar do Brasil e Japão (afinal é um nipo-brasileiro), assistir filmes, internet, seriados, novelas, MPB, POP, ler livros, HQs, jornais, revistas. Adora fazer amigos. encontrar alguém falar de assuntos sérios, discutir a questão LGBT, política (é de centro-esquerda), economia comportamento e bobagens.

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